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É possível lavrar escritura pública declaratória expressando o desejo de doação de seus órgãos

Artigo – Decisões Familiares e Doação de Órgãos: Uma Reflexão a partir do Caso Faustão – Por Patricia Gorisch

Resumo: O tema da doação de órgãos é delicado e intrincado, envolvendo aspectos médicos, éticos e legais. No âmbito da legislação brasileira, esse ato voluntário e altruísta é regulamentado principalmente pela Lei nº 9.434/1997, conhecida como Lei dos Transplantes e pelas leis que a modificaram – Lei nº 11.633, de 2007 e Lei nº 10.211, e pelo Código Civil. O presente artigo busca examinar como a doação de órgãos impactam o direito de família e sucessões, considerando a complexa decisão familiar. Tendo em vista o debate envolvendo a doação de órgãos e a decisão familiar, acentuada pelo Caso Faustão, emerge uma questão fundamental: como o impacto da notoriedade de uma figura pública, exemplificada pelo Caso Faustão, pode influenciar as decisões familiares acerca da doação de órgãos e, consequentemente, afetar a percepção da sociedade brasileira sobre o processo de doação e a legislação vigente?

A Crucial Participação Familiar na Doação de Órgãos: Uma Leitura Legal

O processo de doação de órgãos no Brasil é cercado por uma série de normas e leis que visam garantir a ética e a transparência do ato. Um dos elementos mais significativos dessas regras é o papel da família na tomada de decisões, um aspecto que é claramente delineado em vários artigos da Lei de Transplantes (Lei nº 9.434/1997) e no Código Civil.

O Contexto Legal

O Art. 4º da Lei de Transplantes, modificado pela Lei 10.211/01, estabelece que a retirada de órgãos de pessoas falecidas só pode ocorrer com a autorização expressa do cônjuge ou de um parente até o segundo grau. Tal autorização deve ser firmada em documento e subscrita por duas testemunhas presentes à verificação da morte. Além disso, o Art. 5º diz que, no caso de pessoa juridicamente incapaz, a remoção de órgãos pode ser feita se permitida expressamente por ambos os pais ou responsáveis legais.

Estas disposições colocam a família em uma posição central no processo de doação. É uma responsabilidade significativa e que traz consigo implicações éticas e emocionais.

Família e Autonomia Individual

O Art. 9º da Lei de Transplantes também permite que pessoas juridicamente capazes disponham gratuitamente de tecidos e órgãos para fins terapêuticos em parentes até o quarto grau ou em qualquer outra pessoa, mediante autorização judicial. Isso, de certa forma, é um reconhecimento legal da importância do núcleo familiar nas decisões sobre doação de órgãos.

Essa permissão legal colide e complementa o Art. 14 do Código Civil, que estabelece a validade da disposição gratuita do próprio corpo após a morte. Aqui, é o indivíduo que tem o direito de decidir sobre seu corpo, mas essa decisão é frequentemente relegada à família quando o indivíduo não expressa claramente sua vontade.

O papel da família na decisão sobre a doação de órgãos é claramente destacado na legislação brasileira. A complexidade dessa decisão é agravada pelas questões éticas e emocionais que a cercam. A lei tenta equilibrar a autonomia individual com as responsabilidades familiares, colocando ambas como fundamentais no processo de doação de órgãos. É um aspecto que requer cuidado, sensibilidade e, muitas vezes, coragem por parte dos familiares envolvidos.

A Decisão Familiar

Conforme o artigo 3º da Lei nº 9.434/1997, a retirada de tecidos, órgãos ou partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes depende da autorização da família. Essa exigência legal coloca a família no centro de um debate emocional e ético. No âmbito do direito de família, a decisão envolve questões de autonomia do indivíduo, dignidade da pessoa humana e os interesses da família como um todo. Se o falecido não deixou expressa sua vontade de doar, a família assume a responsabilidade desta escolha, muitas vezes com pouco tempo para deliberar.

Impacto no Direito de Sucessões

A decisão de doar órgãos não tem um impacto direto no campo das sucessões, uma vez que a doação de órgãos não constitui um bem patrimonial. No entanto, indiretamente, pode afetar a execução do testamento se o falecido tiver expressado sua vontade de doar em um documento testamentário e a família optar por não respeitar essa vontade.

Embora o direito brasileiro dê margem para que os desejos expressos em vida pelo falecido sejam honrados, a decisão final ainda recai sobre a família, de acordo com a Lei dos Transplantes.

Aspectos Éticos e Morais

O direito de família se entrelaça aqui com questões éticas e morais, principalmente quando há discordância entre os membros da família ou entre a vontade do falecido e a decisão da família. A Lei dos Transplantes e o Código Civil procuram balizar essa decisão dentro de critérios técnicos e éticos, mas a realidade é que as emoções e crenças pessoais muitas vezes prevalecem, tornando a decisão familiar um momento delicado e complexo.

Influência da Notoriedade na Decisão Familiar

O caso do Faustão pode servir como uma lente através da qual examinamos se e como o perfil público de uma pessoa pode afetar as decisões familiares sobre a doação de órgãos. Isso envolve questões de direito de família, bem como considerações éticas e morais que podem ser amplificadas quando uma pessoa notória está envolvida.

Percepção Pública e Impacto Social

A notoriedade de uma figura pública certamente atrai mais atenção da mídia, o que pode influenciar a percepção pública do ato de doação de órgãos. O caso serviria como um estudo de como a publicidade pode tanto informar quanto distorcer a realidade da doação de órgãos e o rigor da legislação em vigor.

Revisão da Legislação Vigente

A atenção gerada por um caso de alto perfil poderia, potencialmente, levar a uma reavaliação ou discussão sobre as leis atuais relacionadas à doação de órgãos, incluindo a Lei nº 9.434/1997 e as disposições pertinentes do Código Civil brasileiro.

Conclusão

A doação de órgãos no Brasil é uma questão complexa que vai além do ato médico e envolve decisões familiares profundamente emocionais e éticas. Enquanto a Lei dos Transplantes e o Código Civil oferecem o arcabouço legal para a doação, o direito de família e as questões relacionadas à sucessão adicionam mais camadas a essa complexidade. A decisão familiar sobre a doação de órgãos pode não afetar o direito de sucessões diretamente, mas certamente impacta no exercício da autonomia e da dignidade humana, princípios fundamentais que orientam o direito de família no Brasil.

Fonte: IBDFAM

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O que é Nomeação de Inventariante?

Nomear um inventariante é designar o responsável pelo espólio, no inventário — conjunto de bens, direitos e obrigações deixados por uma pessoa após o seu falecimento — conhecido como inventariante. Essa medida facilita a gestão dos bens deixados pelo falecido e o cumprimento de obrigações pendentes, como pagamento de dívidas e questões fiscais.

Nomeação do inventariante

No cartório, a nomeação do inventariante é realizada por meio de escritura pública. Geralmente, os herdeiros ou seus representantes legais indicam a pessoa que desejam nomear como inventariante e sua relação com o falecido, além da sua capacidade para administrar o espólio e outras informações relevantes.

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Após essa análise, o tabelião lavra a escritura pública de nomeação do inventariante, conferindo-lhe os poderes específicos para representar o espólio perante instituições públicas e privadas. Esses poderes podem incluir o acesso a contas bancárias, a venda de bens do espólio e a assinatura de documentos em nome do falecido.

Responsabilidades do inventariante

É importante ressaltar que o inventariante assume responsabilidades importantes no processo de inventário, como a administração dos bens, a prestação de contas aos herdeiros e o cumprimento das obrigações legais e fiscais do espólio. Portanto, a escolha do inventariante deve ser feita com cuidado e consideração.

Saiba mais no Tabelionato Bianchin

Para compreender melhor o processo de inventário e a nomeação do inventariante, entre em contato conosco. Nossa equipe está preparada para fornecer as informações e orientações necessárias.

A importância da ata notarial no reconhecimento de casos de bullying e cyberbullying sob a égide da lei 14.811/24

A promulgação da lei 14.811/24, que incorporou ao Código Penal a classificação do bullying e do cyberbullying como condutas criminosas, constitui um marco legislativo de extrema importância no tocante à salvaguarda das vítimas dessas condutas imoderadas. Nesse contexto, o registro formal dessas ocorrências se torna essencial para o reconhecimento de fatos previstos como crimes e a subsequente persecução penal, conferindo segurança jurídica à veracidade dos eventos: a Ata Notarial se destaca, por conseguinte, como um instrumento jurídico extremamente relevante à tipificação penal, a evidenciar não apenas a conduta de bullying e/ou cyberbullying, mas também a denotar fé pública ao fato.

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Já a “Intimidação sistemática virtual (ou cyberbullying)”, definida no parágrafo único de mesmo artigo 146-A do Código Penal, é determinada como a prática da intimidação sistemática realizada por meio da rede de computadores, redes sociais, aplicativos, jogos online ou qualquer outro meio ou ambiente digital, transmitida em tempo real. Para essa forma de Bullying, a legislação estabelece uma pena mais severa, com reclusão de 2 a 4 anos, além de multa, se a conduta não constituir crime mais grave.

Na conjuntura contemporânea das interações humanas, notadamente marcada pela onipresença das redes sociais e meios digitais, torna-se imperativo abordar a complexidade dessa realidade. Em 2023, observou-se um notável aumento em âmbito nacional nos registros notariais de casos de bullying e cyberbullying, apontando para a importância de uma compreensão mais profunda sobre a necessidade de promover não apenas um tratamento respeitoso ao próximo, mas também de incentivar medidas que favoreçam a redução ou eliminação desses incidentes, juntamente com a aplicação de medidas punitivas quando necessário. Assim sendo, em meio à ausência de urbanidade e, mais preocupante ainda, nas situações que acarretam danos mais graves aos bens jurídicos, a Ata Notarial emerge como um meio de prova crucial, dotado de presunção de veracidade.

A Ata Notarial, cuja legitimidade é respaldada no artigo 384 do CPC (lei 13.105/15), se destaca como um instrumento jurídico fundamental na efetivação dos direitos das partes envolvidas e no compromisso com a busca pela justiça. Sua importância é revelada ao antecipadamente documentar eventos, conferindo-lhes fé pública e, assim, consolidando-se como um suporte inestimável no arcabouço jurídico voltado à proteção das vítimas de intimidações sistemáticas, sendo elas online ou não.

O documento, elaborado por um tabelião de notas, desempenha um papel crucial ao relatar de maneira imparcial os fatos ou circunstâncias presenciadas por este profissional. Ao conferir fé pública a determinados acontecimentos, devido instrumento antecipadamente se constitui como uma prova que pode ser utilizada em processos judiciais; essa função torna-se particularmente relevante nos casos de bullying e cyberbullying, onde a obtenção e preservação de evidências são imprescindíveis para o desdobramento da persecução penal. Num contexto em que a razoabilidade e o respeito frequentemente são negligenciados, a Ata Notarial emerge como um elemento essencial na busca por Segurança Jurídica, especialmente no enfrentamento de práticas ilícitas como o Assédio e crimes contra a honra, a contribuir para a construção de um ambiente jurídico mais justo e equitativo.

Ao abranger diversos tipos de situações, a Ata Notarial oferece flexibilidade na documentação de elementos probatórios: pode ser empregada para comprovar a existência de conteúdos publicados em sites ou redes sociais, mensagens em dispositivos móveis, registros de aplicativos de mensagens, ou qualquer outra circunstância que envolva práticas prejudiciais. A fé pública conferida à Ata Notarial criada pelo tabelião atesta a veracidade dos fatos presenciados; logo, confere ao documento um valor probatório robusto e irrefutável. Isso não apenas simplifica a coleta de provas, mas também eleva a credibilidade das evidências apresentadas no âmbito judicial. Neste sentido, o autor Luiz Guilherme Marinoni1 expressa em livro de sua autoria:

“ata notarial é o instrumento público por meio do qual o notário certifica – por meio da sua condição pública, e do decorrente dever de imparcialidade – a ocorrência de certo fato, por ele presenciado. Por óbvio, considerando que o notário atua aquicom imparcialidade, na função de mero ‘certificador’ da ocorrência do fato por ele verificado, é vedado a ele a emissão de qualquer juízo de valor sobre aquilo que atesta, bem como atestar fatos ‘supostos’ ou por ele não pessoalmente presenciados”.

Destacamos ainda a jurisprudência que confere à Ata Notarial um status de prova irrefutável, fortalecendo sua significativa relevância no âmbito jurídico:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – REGISTRO E ESCRITURA PÚBLICA – DOCUMENTOS DOTADOS DE FÉ PÚBLICA – PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. Em virtude da fé pública notarial e registral, o instrumento lavrado ou registrado pelos notários e oficiais competentes, tem a aptidão de provar os fatos neles narrados, tem-se como verdadeiros os fatos neles afirmados. Embora as declarações firmadas pelo notário ou pelo registrador possam ser inverídicas ou estar contaminada por vícios, como o erro, dolo, coação, estado de perigo, fraude, simulação, neste caso o interessado necessita anular ou nulificar judicialmente o negócio jurídico, comprovando o ato falso ou viciado, e invalidando o ato ou negócio jurídico. Antes disso, não se pode atribuir ato ilícito ao notário. (TJ/MG – AC: XXXXX20442094001 MG, Relator: Marco Aurelio Ferenzini, Data de Julgamento: 3/4/18, Data de Publicação: 13/4/18)

Adicionalmente, é imperativo ressaltar que a Ata Notarial transcende sua função no âmbito jurídico, assumindo uma relevância crucial na conscientização social e prevenção desses crimes. Seu emprego efetivo não apenas robustece a posição das vítimas, a assegurar a integridade e autenticidade de seus relatos, mas também desempenha um papel essencial na edificação de uma consciência coletiva mais ampla sobre os impactos perniciosos de intimidações sistemáticas na sociedade contemporânea. O efetivo uso da Ata Notarial, portanto, não apenas resguarda direitos individuais, mas também contribui para um panorama mais amplo de prevenção e sensibilização em relação a essas práticas prejudiciais.

Em síntese, a Ata Notarial é revelada como uma aliada de inestimável valor no enfrentamento de condutas ilegítimas, inclusive aquelas tipificadas penalmente. Sua intrínseca capacidade de antecipar a constituição de provas, conjugada à sua substancial robustez probatória, não só simplifica o labor das instâncias judiciárias, mas também desempenha um papel crucial na construção de uma sociedade mais equitativa e imune a essas práticas prejudiciais. A adoção criteriosa da Ata Notarial, portanto, emerge como uma imperatividade na salvaguarda dos direitos das vítimas e na promoção da responsabilização efetiva dos perpetradores, a contribuir, por conseguinte, para um panorama social mais resiliente e ético diante dos desafios representados pelo bullying e cyberbullying.

1 MARINONI, Luiz Guilherme et al. O novo processo civil. 2.ª ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.

Fonte: Migalhas