Por Frederico Binato e Tancredo Aguiar
Brasil está prestes a passar por uma grande mudança no âmbito tributário, pois a reforma que está em tramitação busca remodelar por completo a tributação do consumo no país.
Não bastasse isso, a tributação sobre o patrimônio também está passando por mudanças. O que está mudando no âmbito da tributação de herança, por exemplo, por meio de alterações no ITCMD, a princípio parece inofensivo. Todavia não tem nada de inofensivo nas propostas e demonstraremos o perigo que se aproxima no decorrer deste texto.
Antes disso, é bom salientar que o Brasil possui um enorme emaranhado de normas em matéria tributária. É consenso que temos um dos mais complexos Sistemas Tributários do mundo. Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), são produzidas 2,26 normas tributárias a cada hora útil no país, conforme pode ser conferido aqui.
Visando reduzir esta complexidade surgiu a reforma tributária por meio da PEC 45/2019, cujo texto segue para o Senado para análise e votação.
Se a reforma tributária for de fato aprovada, as famílias brasileiras serão diretamente afetadas. Especialmente aquelas que compõem organizações empresariais e/ou que tenham acumulado patrimônio, sejam elas pequenas médias ou grandes, pois precisarão lidar com os efeitos tributários da sucessão no âmbito do Imposto sobre Causa Mortis e Doação (ITCMD).
É bom lembrar que a contratualização no âmbito do Direito de Família já é uma realidade no Brasil. A extensão dos contratos familiares tem sido ampliada e não mais se restringe somente às relações patrimoniais.
No âmbito do Direito Sucessório, os contratos têm a sua importância na prevenção de litígios entre herdeiros e sucessores, o que, sem dúvida, atrai ainda mais a relevância do planejamento sucessório nacionalmente.
As pessoas envolvidas na sucessão familiar (planejamento sucessório) devem adequar-se à realidade patrimonial e empresarial existentes, sendo sabedoras de que nem sempre o aspecto subjetivo vai prevalecer. A razão é simples: as vontades dos herdeiros e sucessores podem ser antagônicas, ou seja, um pode ter aptidão para assumir os negócios e o outro, se o fizer, levará todos à falência.
Por outro lado, a vontade dos autores da herança ou fundadores poderá prevalecer, existindo mecanismos jurídicos para garantir que os líderes da família, se assim o quiserem, continuem no comando enquanto bem entenderem. É sempre um jogo de diálogo e muito entendimento entre os envolvidos.
Com essa pequena introdução, passamos a apresentar o tema propriamente deste texto.
Segundo a matéria publicada pela Fundação Dom Cabral, sob o título “Empresas Familiares São Protagonistas na Economia”, por meio da qual ela cita uma pesquisa do IBGE de meados de 2022, 65% do PIB do Brasil é originado das empresas familiares, que são responsáveis por 75% dos empregos gerados. Significa dizer que a quase totalidade das empresas existentes no país possuem as famílias em seus núcleos.
Esse dado importa em reconhecer que as empresas familiares poderão sofrer maior tributação em seus processos de sucessão, caso a reforma tributária da PEC 45/2019, já aprovada na Câmara dos Deputados, seja de fato também aprovada pelo Senado, casa revisora que deverá se incumbir de promulga-la.
É que a alteração do texto constitucional torna obrigatória a progressividade das alíquotas do ITCMD, devido aos estados nos processos de inventário e partilha e também em planejamentos sucessórios, caso um dos instrumentos adotado seja a doação.
A norma constitucional vigente atualmente estabelece que: “Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: I – transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; § 1º. O imposto previsto no inciso I: […] IV – terá suas alíquotas máximas fixadas pelo Senado Federal; […]”.
Tem-se no texto da norma atual, não alterada, uma faculdade para se estabelecer a progressividade tributária a partir da alíquota máxima fixada pelo Senado, que hoje é de 8%. Dessa forma, os estados, em geral, regulam o ITCMD por meio de uma alíquota única intermediária. Em São Paulo, por exemplo, a alíquota é de 4%, já em Minas Gerais é de 5%. O Rio de Janeiro adotou a progressividade, e patrimônios maiores são tributados com a alíquota de 8%.
O que a reforma tributária apresenta de novo e de muito impactante para as empresas familiares é a obrigatoriedade de adoção da alíquota progressiva por parte dos estados. Veja-se o texto proposto: “VI – será progressivo em razão do valor da transmissão ou da doação”.
Significa dizer, portanto, que os estados serão obrigados a adotarem a progressividade tributária para o ITCMD em seus territórios, a partir da alíquota máxima estabelecida pelo Senado.
Com isso, a tendência é que os estados criem progressões levando em conta a alíquota máxima atual que é de 8%, como mencionamos acima.
Não podemos deixar de mencionar que há um projeto de resolução em tramitação no Senado, o de nº 57/2019, que prevê o aumento da alíquota do ITCMD para 16%. O projeto ainda não foi arquivado ou cancelado. Ele será votado em algum momento.
Diante das considerações acima, é fundamental que os membros de famílias que possuem empresas, patrimônio, investimentos e afins acendam um sinal de alerta e se movimentem. Porque, caso essa reforma tributária seja aprovada e de fato entre em vigor, a sucessão no Brasil ficará mais onerosa.
Outra informação essencial para as empresas e famílias é que as regras novas sobre o ITCMD, se a reforma tributária de fato for aprovada, já terão vigência imediata, podendo ser implementadas já no ano de 2024, conforme previsão do artigo 21 da PEC 45/2019.
Assim, a reforma tributária em si não ficará restrita apenas ao consumo propriamente dito, atingindo patrimônio, renda e demais bens tributáveis no país, com alta propensão de provocar modificações significativas nos ambientes familiares e sucessórios na cadeia das empresas familiares brasileiras.
Fonte: ConJur